O Pantanal, maior planície alagada do mundo e bioma mais preservado do Brasil, conta com 270 anos de colonização, e a preocupação de quem dele depende, como o homem do campo, é tamanha, que 83% da vegetação do bioma permanecem protegidos. E são dados como este que comprovam que o Projeto de Lei 9950/18, conhecido como Lei de Pantanal, precisa de aprimoramentos. Para tanto, foi realizada audiência pública na Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados, em Brasília, nesta terça (20).
A diretora executiva da Associação dos Criadores de Mato Grosso (Acrimat), médica veterinária Daniella Bueno, participou da audiência solicitada pela deputada federal Bia Cavassa (PSDB-MS) para debater o PL, de autoria do deputado federal Alessandro Molon (PSDB-RJ). “O projeto de lei é composto por 22 artigos onde são estabelecidas diversas definições, como as condições para a devida proteção e utilização do bioma; as atividades a serem estimuladas e as atividades proibidas; atividades sujeitas ao licenciamento ambiental; dentre outros”, informa Daniella Bueno.
De acordo com a representante da Acrimat, o posicionamento da associação é de não apoiar o andamento do projeto por diversos motivos. “O PL considera que a delimitação do bioma Pantanal seja remetida à região da bacia hidrográfica do Rio Paraguai, ampliando o número de municípios não inseridos na delimitação do Pantanal de 11 para 53; assim, cidades produtoras ou potencialmente produtoras, como Rondonópolis e Tangará da Serra estariam passíveis de diversas restrições de uso e ocupação do solo”, explica.
Enquanto o bioma Pantanal abrange cerca de 6 milhões de hectares, a região hidrográfica do Paraguai compreende parte de 53 municípios, correspondendo a aproximadamente 20 milhões de hectares, incluindo importantes municípios produtores de gado e agrícola.
Além disso, a ‘Lei do Pantanal’ alteraria o Código Florestal, aumentando a área de Reserva Legal para 50% nas propriedades dentro do bioma Pantanal (Art. 21). “Tal dispositivo gera insegurança jurídica e falta de garantia da continuidade das atividades econômicas já implantadas e/ou consolidadas no bioma e que são grandes responsáveis pela preservação existente”, acrescenta a médica veterinária.
Bueno enumera ainda questões como a previsão de metas de criação de Unidades de Conservação de Proteção Integral fora da realidade do bioma, com 17% de unidades de proteção integral em cinco anos. Atualmente, 4,6% do Pantanal encontram-se protegidos por unidades de conservação, dos quais, apenas 2,9% correspondem a UCs de proteção integral e 1,7% a UCs de uso sustentável, e mesmo assim, mais de 83% do bioma continua intacto.
“O projeto de lei, se aprovado, vai estimular atividades sem considerar a realidade do bioma Pantanal. Pela proposição apenas as atividades descritas no PL deverão ser incentivadas, como gestão sustentável dos recursos pesqueiros e piscicultura apenas com espécies nativas; pecuária com pastagem nativa; agricultura orgânica e redução do uso de pesticidas”, assevera a diretora executiva da Acrimat.
Consenso
De forma geral, os agropecuaristas também criticaram pontos do projeto de lei que ampliam as unidades de conservação e a área de reserva legal no bioma. Segundo o texto, a área de vegetação nativa preservada dentro das propriedades rurais deverá subir dos atuais 20% para 50%. Organizadora do debate na Comissão de Meio Ambiente, a deputada Bia Cavassa (PSDB-MS) questionou: “que impacto o projeto traria para a criação do gado mais orgânico do país? E gado criado solto, sem o estresse do confinamento, se alimentando de pasto nativo e gerando emprego e renda a milhares de famílias que sabem aplicar a palavra desenvolvimento sustentável todos os dias de suas vidas”.
Segundo Cavassa, a proposta deve levar em conta estudos técnicos da Embrapa Pantanal. Já o relator do projeto de Lei do Pantanal, deputado Nilto Tatto (PT-SP), criticou a ausência de debatedores ligados ao meio ambiente. Tatto lembrou ainda que a Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) conseguiu alterar a tramitação da proposta na Câmara para que a Comissão de Agricultura também analisasse o mérito do texto. Tatto defendeu equilíbrio nessa discussão.
O presidente do Instituto do Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (Imasul), Ricardo Eboli, classificou de “desrespeito à soberania” do país a proposta de que a proteção e a utilização do Pantanal sigam algumas convenções internacionais (como as de Aichi e de Ramsar). Para Eboli, o texto tem foco apenas no meio ambiente e desconsidera os aspectos social e econômico do desenvolvimento sustentável.
“As apresentações todas convergiram para demonstrar aos parlamentares que o projeto de Lei do Pantanal não atende ao tripé de sustentabilidade: social, econômico e ambiental”, finalizou Daniella Bueno.
O projeto tramita em caráter conclusivo. Além das Comissões de Meio Ambiente e de Agricultura, a proposta também será apreciada nas Comissões de Finanças e Tributação e de Constituição e Justiça.
Participaram da audiência Lucélia Avi, da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso (Famato); representantes da Federação da Agricultura e Pecuária do Mato Grosso do Sul (Famasul), Embrapa Pantanal e Governo de Mato Grosso.
Com informações Agência Câmara