Nós “das antigas” até podemos trabalhar com a pecuária porque é uma paixão, mas, quando os filhos assumirem a fazenda vão querer saber “quanto de dinheiro a atividade dá”. Aliás, hoje, um dos principais desafios para o setor agropecuário é fazer uma gestão eficiente da propriedade e, paralelamente, o processo de sucessão do negócio.
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Tenho dois filhos que sempre me ajudaram, porém, sem muita responsabilidade. Há dois anos, decidi abrir mão de ter total controle para iniciar esse processo. Fiz de forma planejada: contratei uma assessoria e entreguei as fazendas para os herdeiros, que vêm conseguindo agregar um crescimento de 30% ao ano.
Nosso acordo era esse, se o negócio crescer, eles crescem, o que também é uma forma de entenderem como funciona a lógica de mercado. Sem facilitar para eles. Como estão obtendo sucesso, também me sinto muito mais tranquilo de que conseguirão oferecer suporte à mãe deles em uma possível ausência minha.
É importante destacar que nesses anos todos, já comprei inúmeras fazendas de viúvas que não tiveram essa opção, pois os herdeiros não estavam preparados ou não queriam assumir o negócio. Frente a isso, a sucessão familiar no setor produtivo é fundamental para garantir a longevidade da atividade no campo e mesmo da economia brasileira.
Sucessão e sucesso, aliás, são palavras que possuem o mesmo radical. Essa preparação deveria se iniciar muito cedo, fazendo os filhos “tomarem gosto” pela atividade. É tomar café da manhã falando da fazenda, deixar na escola comentando sobre o gado ou a plantação. Levar para ajudar na vacinação nos fins de semana.
A relação de amor pela propriedade deve ser construída com os herdeiros, para que possam se tornar sucessores “de sucesso”. Outra coisa importante é a modernização. Não adianta, os mais jovens vão querer estar em uma fazendo com “conexão”, isso inclui internet e maquinários que usem as melhores tecnologias.
O saudosismo, nesse sentido, não pode prevalecer, porque não adianta querer ensinar a fazer “como o avô fazia” se aquilo não faz sentido para os mais jovens. Inclusive se não agrega maior sustentabilidade ao negócio. Nossos filhos e netos vão querer trazer novos conceitos e precisamos estar abertos a isso.
Também devemos tirar do vocabulário o termo “eu acho” e trabalhar com a maior precisão possível, utilizando todas as informações e ferramentas disponíveis. Nas minhas propriedades, tudo está informatizado buscando a máxima eficiência. Com isso, temos muito mais segurança para investir, por exemplo.
Os tempos são outros e a fazenda precisa ser administrada como empresa. E nada como “sangue novo” para ajudar nesse processo, concorda? Sou totalmente favorável à renovação. Penso inclusive que o desafio da sucessão familiar só será superado pelo produtor à medida que profissionalizar e renovar a gestão.
Sei que a maioria de nós tem uma imensa satisfação em trabalhar no campo. O problema é que gostamos tanto que, muitas vezes, esquecemos que isso precisa dar dinheiro. Olhando para trás, a fazenda é uma empresa rural que criou várias gerações; e a tendência é criar novas gerações, desde que saibamos aproveitar as novas oportunidades.
Mato Grosso possui o maior rebanho do país, com mais de 31 milhões de cabeças, além de ser um celeiro mundial na produção de alimentos, tudo isso, de forma ambientalmente correta. É inegável a nossa importância para a economia brasileira, porém, essa responsabilidade é igualmente gigante na continuidade nos negócios que precisam passar de “de pai para filhos”.
Aldo Rezende Telles, pecuarista e presidente da Associação dos Criadores Nelore de Mato Grosso (ACNMT), mtnelore@gmail.com