Confinamento: Boi preso para engordar

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Produtores, analistas e dirigentes de associações da pecuária preveem aumento na quantidade de gado em confinamento neste ano. Os bois podem ser criados soltos em pastos ou confinados em cochos.

Entre os motivos para o aumento do confinamento, estão a expectativa de subida ainda mais robusta no preço da arroba do boi, exportações de carne em ritmo galopante puxado pelo apetite dos chineses e uma pequena reação do raquítico consumo interno.

Para o vice-presidente da Associação Nacional da Pecuária Intensiva (Assocon), Sergio Przepiorka, ao menos 7 milhões de cabeças devem ser confinadas até dezembro. O número – recorde – supera em 800 mil os 6,2 milhões de animais confinados no ano passado, que já havia sido o maior desde a adoção da técnica.

Diferente do gado cuja engorda é feita no pasto, no confinamento o ganho de peso se dá 100% no cocho, com ração.

Apesar do aumento da boiada nos confinamentos, o setor da pecuária vive uma fase de incertezas e tem oscilado bastante. Pouca oferta de animais para abate foi a tônica do mercado durante o primeiro semestre e a tendência continua.

No final de junho, o preço da arroba (15 kg), que chegou a R$ 320, agradava aos pecuaristas tradicionais, mas de outro lado as cotações do bezerro para reposição, que substitui as cabeças que vão para o abate, e da comida do gado atingiam picos, desestimulando as fazendas de engorda pouco preparadas tecnologicamente.

“A margem de ganho com a comercialização de um boi é menor, pois a saca de milho custa R$ 99 hoje, ante R$ 80 um ano atrás”, afirma Sergio Przepiorka. Ele também faz a engorda de gado no cocho em Rancharia, interior paulista. O Boitel Chaparral, de sua propriedade, gasta R$ 260 para produzir uma arroba e a negocia por R$ 320 no frigorífico.

O manejo e o trato permitem rentabilidade, o que tem garantido bons resultados para ele e seus parceiros.

O zootecnista Marcos Baruselli comanda o Censo de Confinamento DSM, que promove um giro pelas fazendas dos principais Estados produtores a cada ano, como Mato Grosso, São Paulo e Goiás.

“Os confinamentos se modernizaram e hoje a atividade é sinônimo de lucro”, afirma. É importante lembrar que o volume tem aumentado ano a ano. Na temporada 2020, os cochos receberam 6,2 milhões contra 5,9 milhões no ano de 2019, conforme o Censo DSM.

O período de entressafra começou, os pastos secam e a engorda do boi encontra dificuldades. Como a oferta de gado para os frigoríficos continua escassa, o confinamento entra com força no cenário, explica Lygia Pimentel, analista da Agrifatto, consultoria de São Paulo, e nascida em família de produtores.

Segundo ela, os altos custos das sacas de milho e de soja e a demanda pelo bezerro caro são fatores que desestimulam a engorda. O milho é o principal componente da dieta e o que mais pesa no bolso do fazendeiro.

Mesmo assim, Lygia acredita que a alta forte do preço do boi no segundo semestre vai estimular o confinamento. “Os preços do boi pronto para abate vão saltar e atingir entre R$ 350 e R$ 370 até o final deste ano.”

Otimista, ela prevê acréscimo entre 5% e 6% no confinamento. Segundo a analista, o real desvalorizado frente ao dólar continuará premiando os exportadores de carne, enquanto a pequena melhora prevista para a economia brasileira poderá ajudar o produto a voltar aos poucos à mesa do consumidor.

No momento, o preço da carne bovina supera de longe a inflação e o consumidor deixou de comprar o produto e migrou para a carne de frango ou ovos.

Segundo Baruselli, o confinamento também ajuda a produzir um animal cuja carcaça e carne são preferidas pela China, de longe o maior importador. É o novilho precoce “padrão China”, abatido mais cedo e que produz carne saborosa por conta do marmoreio, a gordura entremeada no músculo. Ele é negociado a valores de até R$ 325 a arroba em São Paulo.

Um exemplo é o confinamento de Chaparral, de Sergio Przepiorka. “Nós produzimos o boi tipo exportação e 95% da oferta é vendida no exterior garantindo uma boa remuneração para os parceiros”, diz Przepiorka. Segundo ele, a produção de carne do Chaparral abastece também as butiques de carne paulistanas. “Essa demanda não para de crescer”, afirma.

Em São Paulo e Mato Grosso, além de Goiás, a predominância nos confinamentos é do gado nelore e anelorado. Tem ainda animais mestiços e os produtos de cruzamento industrial entre o zebuíno (od tipo nelore) e o europeu (angus) ocupam mais espaço.

Um levantamento feito pela DSM apontou que São Paulo ultrapassou Mato Grosso e é o Estado que teve o maior número de bovinos confinados. Baruselli atribui o crescimento de São Paulo a fatores como logística, preço maior da arroba e disponibilidade de ingredientes para preparar a ração.

No Confinamento Monte Alegre, em Barretos (SP), verdadeira “fábrica de carne”, a movimentação diária é frenética, afinal a proposta é fechar o ano com a terminação de 50 mil animais contra 43 mil no ano passado.

A comida é transportada para os cochos quase sem interrupção. Os cochos têm sensores que marcam quantos quilos de alimentos os caminhões já despejaram e ainda precisam despejar.

Confiante, o proprietário, André Luiz Perrone, reconhece a alta nos custos, mas aposta no retorno financeiro da atividade. “O setor de carne bovina mostrará firmeza no segundo semestre, com dólar favorável às exportações e consumo interno melhorando. Destaco a proximidade das festas e a seca que torna rara a já exígua oferta de bois.”

O Confinamento Monte Alegre trabalha em parceria com outros produtores que deixam o gado lá para a fase final de engorda, e com frigoríficos.

Por sinal, tem crescido aceleradamente o sistema chamado boitel no Brasil. Nesse sistema, o gado dos “parceiros” dá entrada nos confinamentos, o preço de venda é estipulado no desembarque, e os caminhões transportam os animais para o frigorífico para o abate. O Chaparral, de Sergio Przepiorka, recebe o gado de outros fazendeiros, faz a engorda e transporta os animais para o frigorífico. Do total de animais lá engordados e terminados, 90% pertencem aos parceiros. “O boitel está abarrotado. Já são 20 mil cabeças”, diz ele.

Como o confinamento tem crescido rapidamente no Rio Grande do Sul, a Scot Consultoria, de Bebedouro (SP), enviou ao Estado uma equipe com a missão de analisar de perto o sistema responsável pela produção da carne reconhecida entre as mais saborosas pelos gourmets.

A equipe percorreu as estâncias de 29 de junho até 9 de julho deste ano. Esteve em dezenas de municípios, como Uruguaiana e Don Pedrito.

Veterinários, zootecnistas, e outros profissionais, constataram que, diferente de regiões como Centro Oeste e Sudeste, os confinamentos são gerenciados pelas famílias e a maioria faz engorda de 200 a 2.000 cabeças, no máximo”, diz Felipe Dahas, veterinário que coordenou o grupo intitulado Confina Brasil pela Scot.

Os gaúchos empregam técnicas modernas de manejo do gado e gestão das fazendas. Para o cocho são destinados somente animais puros das raças angus, hereford e outras, diz Felipe Dahas. Segundo ele, os cochos são cobertos e o piso é concretado em resposta ao clima frio e chuvoso. “A concretagem permite o reaproveitamento dos dejetos”, diz.

Os animais são abatidos bem jovens, aos 18 meses. Após a desmama, a próxima etapa é a do confinamento, relata o veterinário. Esse procedimento também é fundamental e faz da carne produzida nos confinamentos gaúchos uma das preferidas dos consumidores.

Fonte: SEBASTIÃO NASCIMENTO / COLABORAÇÃO PARA O UOL, EM SÃO PAULO