Economia de MT se esgota em 20 anos, aponta AMM

Diretor da Acrimat diz que proposta não deve ser imposta, mas feita a quatro mãos para quatro mãos para que MT alcance industrialização

O presidente da Associação Mato-grossense dos Municípios (AMM), Neurilan Fraga, apresentou nesta terça-feira (7) uma proposta ambiciosa para incentivar a industrialização em Mato Grosso, que passa pela criação de um fundo que taxaria 5% da arrecadação sob a exportação de commodities (milho, soja, algodão, carne e demais produtos primários). Além disso, também propõem lutar em outras duas frentes de trabalho: a primeira apresentando uma proposta de lei de eficiência dos gastos públicos do Estado; e a segunda passaria por uma regulamentação do Auxílio Financeiro para Fomento às Exportações (FEX), trabalhando para tornar os repasses regulares, além de buscar um aumento do auxílio em 50%. No entanto, este último pilar seria de competência federal.

Para Fraga, já passou da hora do Estado de Mato Grosso voltar sua atenção para a industrialização. Segundo o presidente da AMM, os prefeitos enfrentam grandes dificuldades com o agravamento da crise econômica e política do Brasil. “A população cobra do gestor municipal as obrigações do poder público. E nessa condição de crise, houve uma queda significativamente drástica na receita das prefeituras e nós prefeitos não estamos conseguindo prestar os serviços na qualidade e na medida que a população precisa”, reclamou.

Sem títuloDurante a coletiva de imprensa, Fraga explicou que a AMM já tentou ajudar o poder Executivo Estadual, na gestão de Silval Barbosa (PMDB), quando elaborou e apresentou um plano de eficiência dos gastos públicos, mas foi ignorado. “A primeira parte do nosso estudo, coordenado pelo economista Paulo Rabelo de Castro e apresentado em 2012 ao então governador Silval Barbosa (PMDB), já prevíamos que se o Estado não tomasse medidas de contenção, haveria um momento de estrangulamento. Vemos que esse momento chegou e o poder Executivo não está conseguindo mais custear a máquina pública. Se as ações propostas por esse plano tivessem sido tomadas lá atrás, essa situação enfrentada pelo governador Pedro Taques (PSDB) poderia ter sido evitada ou no mínimo abrandada”, argumentou Fraga.

GESTÃO DE GASTOS NO ESTADO – A AMM atualizará o estudo feito em 2013 e entregará ao Governo de Mato Grosso um projeto que visa uma “gestão eficiente do Caixa Público”. Além de diagnosticar os problemas, visando uma reprogramação estratégica da máquina pública, o plano de ações é que novas leis para a aplicação dos tributos arrecadados sejam desenhadas. Segundo o presidente, já foi feito uma projeção de cenários e uma avaliação detalhada das contas públicas.

O estudo, que foi intitulado de Reprogramação Estratégica do Desenvolvimento do Estado e concluído em 2013, possui 71 páginas e no seu bojo há análises dos pontos fortes e fracos do Estado; as ameaças e oportunidades; além de uma agenda de ações para que o Estado encontre o equilíbrio de suas contas. Segundo o documento, “Mato Grosso encerrou a década passada, com a evolução extraordinária da produção total (PIB), havendo alcançado um ritmo de 9,2% ao ano no período. Com esse resultado de ‘proporções chinesas’, o Estado se destacou em primeiro lugar, no item “crescimento do PIB”, dentre os estados da Bahia, Ceará, Goiás, Pará, Santa Catarina. […] Apesar desse índice, o estudo detectou ameaças relevantes ao futuro desempenho da economia estadual. A principal delas advém do comportamento da curva ascendente da despesa pública corrente, cuja taxa de crescimento nominal, em torno de 14% nominais ano, denota uma propensão ao gasto não diretamente produtivo”, diz o documento.

Ainda em 2013, o estudo já apontava para o desequilíbrio das contas no quesito gastos com pessoal: “Foram detectados alguns desvios importantes na análise comparativa com outros Estados. Tanto nos gastos com pessoal, encargos, administração pública, quanto em despesas com Educação e Saúde. […] A reprogramação estratégica do Estado aponta claramente para a necessidade imperiosa de: 1) manter, e até elevar, os índices financeiros de capacidade do Estado cumprir seus compromissos futuros; 2) elevar substancialmente a capacidade futura de investimento; 3) disciplinar a evolução dos gastos correntes, especialmente nas áreas de pessoas e administração pública; 4) limitar a transferência de compromissos de pagamentos para exercícios futuros”.

REGULAMENTAÇÃO DO FEX – Em sua segunda frente de trabalho, o projeto da AMM quer encontrar forças para junto à Confederação Nacional dos Municípios (CNN) buscar que sejam inseridas no FEX regras rígidas para que a União repasse os montantes aos Estados. A lei federal almejada pela AMM quer aumentar a compensação do FEX, que é pago devido às perdas na arrecadação dos Estados regulamentadas pela Lei Kandir, que desobriga os produtores de pagarem o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias (ICMS), principal imposto do Estado.

“Nós queremos que haja um mecanismo legal, que assegure o repasse do dinheiro por meio da Lei Orçamentária Anual (LOA) da União. A compensação deve ser de no mínimo 50% do que os Estados e municípios deixam de arrecadar com a desoneração das exportações. Deixamos de tributar R$ 2,4 bilhões, então queremos que esse valor seja de no mínimo R$ 1 bilhão por ano e de forma regular, sem dor de cabeça e no dia que a União acha que deve”, disse Neurilan Fraga.

EXPORTAÇÕES – Para o economista Vivaldo Lopes, é possível industrializar o Estado sem prejudicar o agronegócio. Contudo, reconhece que uma ajuda do setor é imprescindível para concretização do projeto. “Em números arredondados Mato Grosso produziu 29 milhões de toneladas soja em 2015 e desse total exportou 19,4 milhões – ou seja, 66% da produção local. Foi produzido 26,7 milhões de toneladas de milho e se exportou 20 milhões de toneladas, o que corresponde a 70% da produção. Isso confirma que a economia de Mato Grosso é eminentemente agroexportadora. O valor total das exportações de commodities em Mato Grosso, no ano passado, foi de US$ 13 bilhões. Desse montante, 73% foram exportadas por 15 tradings, entre nacionais e internacionais. Elas não podem dedicar parte disso para ficar em Mato Grosso e ser destinados à industrialização? ”, questionou Lopes. Para ele, o modelo econômico baseado na exportação primária deverá se extinguir nos próximos 20 anos. Lopes apontou os mecanismos possíveis para incentivar o processo de industrialização no Estado. “Até quando o Estado resistirá com uma economia assim? É preciso dar o passo seguinte: a industrialização. E como faremos isso? Primeiro buscando o financiamento de bancos como o BNDES e o Banco do Brasil, da iniciativa privada e da mobilização dos poderes públicos. Além disso, um fundo precisa ser criado para dar força a essa pauta. A industrialização não é um bicho de sete cabeças, prova disso é o estado de Goiás, que está no nosso lado e há vinte anos tinha essencialmente sua economia igual a nossa. Mas lá eles conseguiram alavancar o processo de industrialização. Então isso é possível, sem prejudicar o agronegócio. Ainda é preciso construir de onde virão os recursos desse fundo, mas só para dar um exemplo: MT exportou US$ 13 bilhões no ano de 2015. Se 5% desse montante fosse destinado a um fundo, já teríamos arrecadado R$ 2,5 bilhões por ano para investimentos”, disse.

OUTRO LADO – Para o presidente da Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja-MT), Endrigo Dalcin, a medida de taxar as tradings é um “tiro no pé”. Segundo o entendimento do representante, o incentivo à industrialização no Estado deveria partir do próprio Estado e dos representantes do setor industrial. “Já disse em várias ocasiões que taxar/onerar ou cobrar qualquer quantia dos exportadores afastará investidores de Mato Grosso. Isso já está começando a acontecer, pois cada vez que o Estado tenta intervir na economia esse é o resultado”, disse.GAZETA

O argumento é reforçado pelo diretor da Associação dos Produtores de Gado de Mato Grosso (Acrimat), Júlio Rocha. “É óbvio que qualquer oneração nas exportações fará com que as tradings repassem os prejuízos para os médios e pequenos produtores. Essa contribuição que estão propondo é um mero eufemismo para não soar como imposição essa história de criar um tributo provindo do setor primário para incentivar a industrialização. O processo tem que ser o inverso: o Estado precisa incentivar as indústrias para que elas queiram se instalar aqui. Agora todas as soluções para a crise de Mato Grosso passam por uma taxação do agronegócio. Não é admissível que se faça um plano de industrialização retirando dinheiro dos produtores, é incoerente. Já contribuímos com o Fethab, passamos por gargalos, como distâncias e falta de logística, e ainda querem tirar dinheiro dos produtores”.

Apesar disso, Rocha informou que o setor produtivo de Mato Grosso está disposto a ajudar, conduto a proposta obrigatoriamente deverá ser construída em comum acordo com o Estado e os representantes do agronegócio. “Já nos reunimos com o governador e ele disse que não taxará os produtores. Nós estamos dispostos a ajudar, mas que essa contribuição deverá ser destinada a uma aplicação específica e não para custear máquina e pagamentos de salários, isso jamais. O setor já falou que irá ajudar, mas isso precisa ser feito a quatro mãos. Até o fim do mês isso deverá ser definido pelo governo. Sabemos que isso vai ser uma forma de nos taxar, mas que se tente encontrar um meio termo, no qual os produtores não sejam afetados drasticamente e o governo arrecade um montante para bancar investimentos”.